O preço do leite entregue em agosto e recebido pelo produtor em setembro registrou a quarta queda consecutiva no campo, com recuo de 7 centavos/litro (ou de 6,16%) frente a agosto, segundo pesquisas do Cepea-Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada, da Esalq/USP

O preço líquido, que não considera frete ou impostos, fechou a R$ 1,0843/litro na “média Brasil”, que inclui os estados de BA, GO, MG, SP, PR, SC, RS. Na comparação com setembro do ano passado, a diminuição é de quase 48 centavos/litro, ou de 30,6% (dados deflacionados pelo IPCA de agosto/17). As sucessivas baixas no valor do leite se justificam pela fraca demanda e pelo aumento da captação.

O consumo de lácteos segue enfraquecido na ponta final da cadeia, em função do menor poder de compra do consumidor brasileiro. Dessa forma, os preços dos derivados têm diminuído significativamente, em uma tentativa de manter o fluxo de negociações. O valor do leite UHT, por exemplo, lácteo mais consumido no País, registrou queda de 7,8% em termos reais, entre agosto e setembro, no mercado atacadista do estado de São Paulo (IPCA de agosto/17). Mesmo assim, agentes de indústrias e atacados consultados pelo Cepea continuam reportando aumento de estoques, fator que pressiona as cotações no campo.

A formação de estoques também esteve atrelada a maior captação de leite. De acordo com o Índice de Captação de Leite (ICAP-L), de julho para agosto, a captação das indústrias se elevou 4,9% na “média Brasil”. Todos os estados, com exceção da Bahia, registraram altas no índice, mas o destaque foi para os estados do Sul do País. Em Santa Catarina, o aumento foi de 11,7%; no Rio Grande do Sul, de 6,8%, e no Paraná, de 4,7%.  Segundo agentes, a maior oferta no Sul reduziu os preços também no Sudeste, região que é destino de parte da produção sulista por concentrar o maior mercado consumidor do Brasil. No comparativo entre a média de janeiro a agosto de 2016 com a do mesmo período deste ano, o ICAP-L na “média Brasil” registou alta de 14,9%.

O atual cenário tem preocupado o setor. O consumo de lácteos só tem sido estimulado com preços baixos nas gôndolas. A queda na ponta final da cadeia, entretanto, não parece ocorrer na mesma intensidade que nos elos anteriores. Varejo e atacado pressionam a indústria para redução nos preços dos derivados e aumento do prazo de pagamento, uma vez que os estoques têm aumentado.

As indústrias, por sua vez, têm que lidar com um difícil equilíbrio entre receber de seus clientes, manejar estoques, definir estratégias de processamento que garantam vendas e pagar a matéria-prima. Por isso, também consideram reajustar os prazos de pagamento no campo, arriscando perder produtores no médio prazo.

Pecuaristas, por fim, enfrentam o desafio de manter sua rentabilidade com a receita diminuindo, em um momento decisivo para o planejamento das atividades para o próximo ano: a reforma das pastagens. Somado a isso, a recente valorização do milho, atrelada ao aumento dos embarques do cereal, e o atraso do plantio da próxima safra (em função da falta de chuvas) indicam a possibilidade de continuidade de aumento nos preços do cereal e da ração. Assim, alguns produtores planejam aumentar as áreas de silagem para diminuir os custos com alimentação no ano que vem. Porém, essa tomada de decisão pode ser influenciada pelo atual panorama. 

Índices e preços na região Sul – A tendência apontada pelo Cepea tem confirmações pontuais na região sul. No estado do Rio Grande do Sul, o valor de referência do leite projetado para setembro é de R$ 0,8519, 4,4% abaixo do consolidado de agosto (R$ 0,8914), segundo o Conseleite gaúcho. No acumulado dos últimos três meses (julho e setembro de 2017), houve uma diminuição de 9,4% no valor de referência.

“Mas o maior problema é a queda de consumo pela perda de poder aquisitivo da população e pelo nível elevado de desemprego associados à importação com valores mais competitivos que o nosso”, avalia o presidente do Conseleite, Alexandre Guerra. O dirigente destacou que o setor precisa de medidas governamentais que ajudem a tirar a pressão de mercado gerada pelas importações.

O professor da UPF-Universidade de Passo Fundo, Eduardo Finamore, responsável pelo estudo mensal, confirma que a redução na comercialização de leite deve-se à queda da renda do consumidor e também ao excesso de oferta no mercado, que “joga os preços para baixo”. Por isso, alerta que não é um bom momento para pensar no aumento da escala de produção. “Temos que garantir o que nós produzimos com qualidade e com preço”, avalia.

Já em Santa Catarina, o Conseleite do estado projetou que o leite entregue em setembro a ser pago em outubro terá uma redução de 7% nos valores de referência. Os valores projetados são os seguintes: leite acima do padrão R$ 1,0910/litro; leite padrão R$ 0,9487 e abaixo do padrão R$ 0,8625. A tendência de queda, neste ano iniciado precocemente em junho, intensificou-se em agosto e segue o mesmo ritmo em setembro.

“O recuo na cotação do leite no campo continua ocorrendo em razão da demanda enfraquecida por lácteos na ponta final da cadeia produtiva, já que o consumo de lácteos está diretamente relacionado ao aumento da renda e o menor poder de compra do consumidor brasileiro segue desaquecendo o mercado. Além disso, o aumento da oferta e as importações de leite também contribuem para a queda dos preços”, avalia o presidente do Conseleite/SC, Adelar Maximiliano Zimmer.

Zimmer alertou que a queda de consumo de lácteos no mês de setembro mês foi geral. “Houve redução em derivados e também no leite em pó. Isso nos preocupa. Os valores estão se comparando aos de 2013, quando foram registrados pela última vez os menores valores praticados. Uma das opções que poderia amenizar a situação seria a compra do excedente de leite por parte do governo”.

Alta nos custos de produção – O Índice de Custo de Produção da Scot Consultoria para a atividade leiteira apresentou alta de 0,8% em setembro, em relação a agosto deste ano. Foi o segundo mês consecutivo de aumento nos custos. A alta nas cotações dos concentrados, com destaque para o milho, foi o principal motivo deste movimento.

“Em curto prazo, as cotações do grão e de outros alimentos concentrados deverão exercer pressão de alta sobre os custos de produção da atividade. O clima seco e as pastagens em condições ruins colaboram com este cenário, já que aumentam a necessidade de suplementação dos animais”, afirma Juliana Pita, analista de mercado da Scot.

E com a projetada da tendência de quedas nos preços do leite ao produtor nos próximos pagamentos, a expectativa é de estreitamento da margem. Mesmo assim, apesar da alta nos dois últimos meses, os custos de produção estão 12,8% abaixo na comparação com setembro do ano passado.

A Scot, em análise recente, utilizando-se de dados do IBGE-Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas, aponta que o volume de leite adquirido pelos laticínios no país aumentou 3,7% no primeiro semestre de 2017, em relação ao mesmo período de 2016.

“Foram adquiridos 11,49 bilhões de litros nos primeiros seis meses deste ano, considerando as indústrias com inspeção municipal, estadual e federal”, informa a analista. Os números fazem parte da Pesquisa Trimestral do Leite. A expectativa é de aumento da produção de leite no Brasil em 2017, depois de dois anos de queda (2015 e 2016).

De janeiro a agosto deste ano, a produção de leite no país aumentou 2,1% em relação ao mesmo período do ano passado. Além do clima mais favorável no primeiro semestre deste ano, a queda nos custos de produção, especialmente com relação a alimentação concentrada, ajudou no aumento da produção de leite no país este ano, mesmo com a pressão de baixa nos últimos pagamentos.

Tabela 1

Preços pagos pelos laticínios (brutos) e recebidos pelos produtores (líquido) em SETEMBRO/17 referentes ao leite entregue em AGOSTO/17

Fonte: Cepea-Esalq/USP.

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